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O atual e o virtual (Deleuze 1996)

O atual e o virtual (Deleuze 1996)

DELEUZE, Gilles. 1996. O atual e o virtual. In: Éric Alliez. Deleuze Filosofia Virtual. (trad. Heloísa B.S. Rocha) São Paulo: Ed.34, pp.47-57.

Deleuze começa a primeira seção apresentando a Filosofia como “a teoria das multiplicidades”. Logo em seguida precisa que “[t]oda multiplicidade implica elementos atuais e elementos virtuais” (p.49). Ele então começa a tratar das relações entre tais elementos, primeiro colocando uma “partícula” no lugar do atual (com suas imagens virtuais) e em seguida colocando as “percepções” no mesmo lugar (mas dessa vez com as lembranças no lugar do virtual). Por fim, é na relação necessária do atual com o virtual que Deleuze vai localizar o plano de imanência:

O plano de imanência compreende a um só tempo o virtual e sua atualização, sem que possa haver aí limite assimilável entre os dois. O atual é o complemento ou o produto, o objeto da atualização, mas esta não tem por sujeito senão o virtual. A atualização pertence ao virtual. A atualização do virtual é a singularidade, ao passo que o próprio atual é a individualidade constituída. O atual cai para fora do plano como fruto, ao passo que a atualização o reporta ao plano como àquilo que reconverte o objeto em sujeito. (Deleuze 1996:51)

Deleuze abre a segunda seção do texto lembrando que o movimento de desdobramento de virtualidades a partir do atual coexiste com outro movimento de aproximação do atual de seu virtual. A teoria bergsoniana das lembranças é evocada (assim como A Dama de Xangai) para tratar da crescente indiscernibilidade (ou alternância) entre o atual e o virtual neste segundo movimento, que culmina com a imagem do cristal.

Essa troca perpétua entre o virtual e o atual define um cristal. (Deleuze 1996:54)

Deleuze então distingue a singularização/atualização (definida pela propagação de virtuais a partir de um atual) da individuação/cristalização (definida pela alternância entre um atual e o seu virtual).

A pura virtualidade não tem mais que se atualizar, uma vez que é estritamente correlativa ao atual com o qual forma o menor circuito. (Deleuze 1996:54)

Deleuze prossegue então para demonstrar como a mesma relação entre o atual e o virtual nas variantes singularização/atualização e individuação/cristalização opera na compreensão do “Tempo”:

Os dois aspectos do tempo, a imagem atual do presente que passa e a imagem virtual do passado que se conserva, distinguem-se na atualização, tendo simultaneamente um limite inassinalável, mas intercambiam-se na cristalização até se tornarem indiscerníveis, cada um apropriando-se do papel do outro. (Deleuze 1996:55)

E sintetiza o argumento desenvolvido até aqui:

A relação do atual com o virtual constitui sempre um circuito, mas de duas maneiras: ora o atual remete a virtuais como a outras coisas em vastos circuitos, onde o virtual se atualiza, ora o atual remete ao virtual como a seu próprio virtual, nos menores circuitos onde o virtual cristaliza com o atual. O plano de imanência contém a um só tempo a atualização como relação do virtual com outros termos, e mesmo o atual como termo com o qual o virtual se intercambia. (Deleuze 1996:55-6)

As últimas frases desta seção (e do texto) explicitam a importante distinção entre uma relação entre atuais e uma relação do atual com o virtual.

Em todos os casos, a relação do atual com o virtual não é a que se pode estabelecer entre dois atuais. Os atuais implicam indivíduos já constituídos, e determinações por pontos ordinários; ao passo que a relação entre o atual e o virtual forma uma individuação em ato ou uma singularização por pontos relevantes a serem determinados em cada caso.(Deleuze 1996:5)

Assim como nos livros de Deleuze sobre cinema, a teoria bergsoniana das imagens é central para a argumentação. O processo de cristalização também aparecerá no conceito deleuziano de imagem-tempo. Quanto à oposição “pontos ordinários”X”pontos relevantes”, pode ser relacionada à Etologia que ele encontrou em Von Uexküll e relacionou à Ética de Espinosa.

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