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Máquinas desejantes em 1982 (Guattari e Rolnik 1996)

Máquinas desejantes em 1982 (Guattari e Rolnik 1996)

Acho muito mais vantajoso partir para uma teoria do desejo que o considere como pertencendo propriamente a sistemas maquínicos altamente diferenciados e elaborados. E, quando digo “maquínico”, não me refiro a mecânico, nem necessariamente a máquinas técnicas. As máquinas técnicas existem, é claro, mas há também máquinas sociais, máquinas estéticas, máquinas teóricas e assim por diante. Em outras palavras, há máquinas territorializadas (em metal, em eletricidade, etc.), assim como há também máquinas desterritorializadas que funcionam num nível de semiotização completamente outro. (Guattari, in: Guattari e Rolnik 1996:239)

Forjei, com Gilles Deleuze, […] o conceito de “máquina desejante”. É a ideia de que o desejo corresponde a urn certo tipo de produção e que ele não é absolutamente algo de indiferenciado. O desejo não é nem urna pulsão orgânica, nem algo que estaria sendo trabalhado, por exemplo, pelo segundo princípio da termodinâmica, sendo arrastado de maneira inexorável por uma espécie de pulsão de morte. O desejo, ao contrário, teria infinitas possibilidades de montagem. […] Isso não quer dizer que o desejo seja uma força que, por si mesma, vá construir todo um universo coordenado. Gilles Deleuze e eu estamos inteiramente distanciados de qualquer ideia de espontaneísmo neste campo. O desejo, para nós, não é a nova fórmula do bom selvagem de Jean Jacques Rosseau. Ele também pode, como toda máquina que se preze, se paralisar, se bloquear (e até muito mais do que qualquer máquina técnica); ele corre o risco de entrar em processos de implosão, de autodestruição, que no campo social poderão se manifestar através de fenômenos que eu e Deleuze chamamos de “microfascismos”. Portanto, para nós, a questão está em se tentar apreciar o que é efetivamente a economia do desejo, num nível pré-pessoal, num nível das relações de identidade ou das relações intra-familiais, assim como em todos os níveis do campo social. (Guattari, in: Guattari e Rolnik 1996:239-40)

GUATTARI, Félix; ROLNIK, Suely. 1996. Desejo e história. In: Micropolítica: cartografias do desejo. Petrópolis: Vozes, p.197-273.