study note
Reticulação no MEOT (Simondon 2008 [1958])

Reticulação no MEOT (Simondon 2008 [1958])

SIMONDON, Gilbert. 2008. Du mode d’existence des objets techniques. Paris: Aubier. [1958]

Nas duas primeiras partes do livro, Simondon usa os termos “rede” e “reticulação” poucas vezes, sempre em sentido banal, nunca com carga conceitual. Um exemplo deste tipo de uso banal do termo é o seguinte

REDE E CONCETIZAÇÃO

A essência da concretização do objeto técnico é a organização de sub-conjuntos funcionais no funcionamento total; partindo desse princípio, pode-se compreender em que sentido se opera a redistribuição das funcões na rede de diferentes estruturas (Simondon 2008:34)

Simondon começa a usar os termos “rede” e “reticulação” com sentido conceitual na terceira parte do livro, “Essência da tecnicidade”, mais especificamente na seção “II. A defasagem da unidade mágica primitiva”, página 164, como segue.

RETICULAÇÃO MÁGICO-PRIMITIVA DO MUNDO COMO “HIPÓTESE GENÉTICA GERAL” DA RELAÇÃO HUMANO-MUNDO (figura/fundo)

a etapa mágica […] [é] a estruturação mais simples e fundamental do meio de um ser vivo: o nascimento de uma rede de pontos privilegiados de troca entre o ser e o seu meio. (Simondon 2008:164)

De fato, antes da segregação das unidades [sujeito e objeto], se institui uma reticulação do espaço e do tempo que coloca em evidência lugares e momentos privilegiados, como se todo o poder de agir do homem e toda a capacidade do mundo de influenciar o homem se concentrassem nesses lugares e nesses momentos. Esses lugares e esses momentos detêm, concentram, e exprimem as forças contidas no fundo de realidade que os suporta. Esses pontos e esses momentos não são realidades separadas; eles retiram sua força do fundo que eles dominam; mas eles localizam e focalizam a atitude do ser vivo frente a seu meio. (Simondon 2008:164)

O universo mágico é estruturado segundo a mais primitiva e a mais pregnante das organizações: aquela da reticulação do mundo em lugares privilegiados e em momentos privilegiados. Um local privilegiado, um local que tem um poder, é aquele que canaliza para ele toda a força e a eficácia do domínio que ele limita; ele resume e contém a força de uma massa compacta de realidade; ele a resume e a governa, como um lugar elevado governa e domina uma região baixa […]. O mundo mágico é feito, assim, de uma rede de lugares e de coisas que têm um poder e são ligadas às outras coisas e aos outros lugares que também têm poder. Tal caminho, tal muralha, […], contêm toda a força da região, o ponto-chave da realidade e da espontaneidade das cosias, assim como de sua disponibilidade. (Simondon 2008:164-5)

[O] pensamento mágico […] corresponde à estruturação mais simples, mais concreta, mais vasta e mais flexível: aquela da reticulação. Na totalidade constituída pelo homem e pelo mundo aparece, como primeira estrutura, uma rede de pontos privilegiados realizando a inserção do esforço humano, e através dos quais se efetuam as trocas entre o homem e o mundo. Cada ponto singular concentra em si a capacidade de comandar uma parte do mundo que ele representa particularmente e da qual ele traduz a realidade, na comunicação com o homem. Pode-se nomear esses pontos singulares de pontos-chave comandando a relação homem-mundo, de maneira reversível, pois o mundo influencia o homem como o homem influencia o mundo. São os cumes das montanhas ou certos desfiladeiros, naturalmente mágicos, pois governam uma região. […] [S]ão realidades que concentram os poderes naturais assim como focalizam o esforço humano: elas são estruturas de figura com relação à massa que as suporta, e que constitui seu fundo. (Simondon 2008:165)

OS NÓS DA REDE SÃO OBJETIVOS-SUBJETIVOS

Em tal rede de pontos-chave, de marcos, existe indistinção primitiva da realidade humana e da realidade do mundo objetivo. Tais pontos-chave são reais e objetivos, mas eles são aquilo pelo qual o ser humano é imediatamente religado ao mundo, ao mesmo tempo para receber sua influência e para agir sobre ele; esses são os pontos de contato e de realidade mista, mútua, locais de troca e de comunicação pois eles são feitos de um nó entre as duas realidades. (Simondon 2008:165)

ATOS DE EXCEÇÃO E RETICULAÇÃO

O desejo de conquista e o senso de competição existem, talvez, na motivação que permite passar da existência corriqueira a […] atos de exceção; mas trata-se, sobretudo, quando invocamos o desejo de conquista, de tornar legítimo para uma comunidade um ato individual. De fato, no ser individual ou no grupo restrito daqueles que realizam o ato de exceção, é um pensamento muito mais primitivo e muito mais rico que está operando. […] A ascenção, a exploração, e mais geralmente todo gesto pioneiro, consistem em aderir aos pontos-chave da natureza presente. […] [E]stabelecer com [eles] uma relação de amizade. (Simondon 2008:166)

O universo mágico é feito da rede dos lugares de acesso a cada domínio de realidade: ele consiste em umbrais, cumes, limites, pontos de passagem, ligados uns aos outros por sua singularidade e seu caráter excepcional. (Simondon 2008:166)

TEMPO

Essa rede de limites não é somente espacial, mas também temporal; existem datas notáveis, momentos privilegiados para começar esta ou aquela ação. Aliás, a própria noção de início é mágica (Simondon 2008:166-7)

Ora, o tempo corrente e o espaço corrente servem de fundo a tais figuras; dissociadas do fundo, as figuras perdem sua significação; folgas e celebrações não são um repouso com relação à vida corrente, por interrupção da vida corrente, mas uma busca dos lugares e das datas privilegiadas com relação ao fundo contínuo. (Simondon 2008:167)

ESTRUTURA DE FIGURA=RETICULACÃO

Essa estrutura de figura […] é a reticulação do universo em pontos-chave privilegiados pelos quais passam as trocas entre o vivo e seu meio. (Simondon 2008:167)

DEFASAGEM

Enquanto os pontos-chave se objetivam na forma de ferramentas e de instrumentos concretizados, os poderes de fundo se subjetivam ao se personificar sob a forma do divino e do sagrado (Deuses heróis, sacerdotes). (Simondon 2008:168)

IMPRESSÃO ESTÉTICA

A impressão estética implica um sentimento da perfeição completa de um ato, perfeição que lhe dá objetivamente uma difusão e uma autoridade pela qual ele se torna um ponto notável da realidade vivida, um nó da realidade experienciada. Esse ato se torna um ponto notável da rede da vida humana inserida no mundo; desse ponto notável aos outros, um parentesco superior se cria que reconstitui um análogo da rede mágica do universo. (Simondon 2008:180)

RETICULAÇÃO ESTÉTICA DO PENSAMENTO

O destino do pensamento estético, ou mais exatamente da inspiração estética de todo pensamento tendendo à realização, é de reconstituir, no interior de cada modo de pensamento, uma reticulação que coincide com a reticulação dos outros modos de pensamento: a tendência estética é o ecumenismo do pensamento. […] [P]oderia ser dito que cada pensamento tende a se reticular e a aderir novamente ao mundo após ter-se afastado dele. (Simondon 2008:181)

NOVA RETICULAÇÃO TÉCNOESTÉTICA

[U]ma nova reticulação, escolhida pela técnica, se institui dando um privilégio a certos lugares do mundo, numa aliança sinérgica dos esquemas técnicos e dos poderes naturais. Lá aparece a impressão estética, neste acordo e nesta superação da técnica que se torna novamente concreta, inserida, religada ao mundo pelos pontos-chave mais notáveis. A mediação entre o homem e o mundo se torna ela mesma um mundo, a estrutura do mundo. (Simondon 2008:181)

RETICULAÇÃO ESTÉTICA

Ora, a atividade estética preserva precisamente essa estrutura de reticulação. (Simondon 2008:182)

RETICULAÇÃO ESTÉTICA DO MUNDO

Existe no mundo um certo número de lugares notáveis, de pontos excepcionais que atraem e estimulam a criação estética, como existe na vida humana um certo número de momentos particulares, radiantes, se distinguindo dos outros, que chamam à obra. A obra, resultado dessa exigência de criação, dessa sensibilidade aos lugares e aos momentos de exceção, não copia o mundo ou o homem, mas os prolonga e se insere neles. Mesmo sendo destacada, a obra estética não vem de uma ruptura do universo ou do tempo vital do homem; ela vem somar-se à realidade já dada, trazendo-lhe estruturas construídas, mas construídas sobre fundações que fazem parte do real e inseridas no mundo. Assim, a obra estética faz brotar o universo, o prolonga, constituindo uma rede de obras, isto é, de realidades excepcionais, radiantes, de pontos-chave do universo mágico […] [;] a rede espacial e temporal das obras de arte é, entre o mundo e o homem, uma mediação que conserva a estrutura do mundo mágico. (Simondon 2008:184)

EDUCAÇÃO TÉCNICA e RETICULAÇÃO TECNOESTÉTICA

[É] preciso uma educação técnica para que a beleza dos objetos técnicos possa aparecer como inserção de esquemas técnicos num universo, nos pontos-chave desse universo. (Simondon 2008:186)

OBJETO ESTÉTICO COMO NÓ DE REDE

Assim, pode-se dizer que o objeto estético não é um objeto propriamente dito, mas sobretudo um prolongamento do mundo natural ou do mundo humano, que permanece inserido na realidade que o porta. Ele é um ponto notável de um universo; esse ponto […] não é arbitrariamente colocado no mundo; ele representa o mundo e focaliza suas forças, suas qualidades de fundo […]; ele se mantém em um estatuto intermediário entre a objetividade e a subjetividade puras. (Simondon 2008:187)

A RETICULAÇÃO ESTÉTICA DO MUNDO COMO UMA REDE DE ANALOGIAS

A realidade estética se encontra, assim, sobreposta à realidade dada, mas segundo linhas que já existem na realidade dada; ela é aquilo que re-introduz, na realidade dada, as funções figurais e as funções de fundo que, no momento da dissociação do universo mágico, se tornaram técnicas e religião. Sem a atividade estética, entre técnicas e religião não existiria nada além de uma zona neutra de realidade sem estrutura e sem qualidades; graças à atividade estética, essa zona neutra, mesmo permanecendo central e equilibrada, reencontra uma densidade e uma significação; ela retoma, através das obras estéticas, a estrutura reticular que se estendia ao conjunto do universo antes da dissociação do pensamento mágico. […] Enquanto o pensamento técnico é feito de esquemas, de elementos figurais sem realidade de fundo, e o pensamento religioso é feito de qualidades e de forças de fundo sem estruturas figurais, o pensamento estético combina estruturas figurais e qualidades de fundo. Em lugar de representar, como o pensamento técnico, as funções elementares, ou, como o pensamento religioso, as funções de totalidade, o pensamento estético mantém juntos elementos e totalidade, figura e fundo, na relação analógica; a reticulação estética do mundo é uma rede de analogias. (Simondon 2008:189)

O pensamento estético apreende os seres como individuados e o mundo como uma rede de seres em relação analógica. (Simondon 2008:191)

TROPISMOS

[A realidade estética] é uma certa maneira de ser do vivo no mundo, comportnado caracteres de atração, direções, tropismos no sentido próprio do termo. (Simondon 2008:192)

DESTINO RETICULAR

O destino é essa coincidência da linha da vida e da realidade do mundo através de uma rede de gestos tendo valor excepcional. (Simondon 2008:195)

RETICULAÇÃO ESTÉTICA COMO MISTÉRIO

[A] arte faz com que toda realidade, singular no espaço e no tempo, seja, no entanto, uma realidade em rede: este ponto é homólogo de uma infinidade de outros que lhe respondem e que são ele mesmo sem, no entanto, eliminar a ecceidade de cada nó da rede: nessa estrutura reticular do real reside isso que poderíamos chamar de mistério estético. (Simondon 2008:201)

RETICULAÇÃO TÉCNICA é mais profunda que RETICULAÇÃO TRADICIONAL

[N]a medida em que uma tecnologia politécnica substitui as técnicas separadas, as próprias realidades técnicas, na sua objetividade realizada, assumem uma estrutura de rede; elas estão em relação umas com as outras, em lugar de se bastarem a si mesmas, como os trabalhos dos artesãos, e elas estão em relação com o mundo que elas encerram nas malhas de seus pontos-chave: as ferramentas são livres e abstratas, transportáveis para qualquer lugar e para qualquer tempo, mas os conjuntos técnicos são verdadeiras redes concretamente ligadas ao mundo natural; uma barragem não pode ser construída em qualquer lugar, assim como um forno solar. Algumas noções da cultura tradicional parecem supor que o desenvolvimento das técnicas causa o desaparecimento do caráter particular de cada local e de cada região, levando à perda dos costumes e idiomas artesanais locais; na realidade, o desenvolvimento das técnicas cria uma concretização muito mais importante e muito mais fortemente enraizada do que aquela que ela destrói; um costume artesanal, como um costume regional, pode se transportar, por simples influência, de um lugar para outro; ela quase só se enraíza no mundo humano; ao contrário, um conjunto técnico é profundamente enraizado no meio natural. Não existem minas de carvão em terrenos primários. […] Assim se constituem certos lugares privilegiados do mundo, natural, técnico e humano; é o conjunto, a interconexão desses lugares privilegiados que fazem, desse universo politécnico, um universo ao mesmo tempo natural e humano; as estruturas dessa reticulação se tornam sociais e políticas. (Simondon 2008:219-20)

RETICULAÇÃO TÉCNICA exige RETICULAÇÃO FILOSÓFICA e CULTURAL (o conceito de “rede” e o “poder regulador concreto” da cultura)

[N]ão existe um pensamento suficientemente desenvolvido para permitir a teorização dessa reticulação técnica dos conjuntos concretos. É à filosofia que cabe a tarefa de constituir esse pensamento, pois existe aí uma realidade nova que não é ainda representada na cultura. […] Existe um mundo da pluralidade das técnicas, que tem suas próprias estruturas e que deveria encontrar representações adequadas de si no mundo da cultura; ora, o termo geral “rede”, comumente empregado para designar as estruturas de interconexão de energia elétrica, telefones, estradas de ferro, rodovias, é impreciso demais e não dá conta dos regimes particulares de causalidade e de condicionamento que existem nas redes, e que as religam funcionalmente ao mundo humano e ao mundo natural, como uma mediação concreta entre esses dois mundos. […] A introdução, na cultura, de representações adequadas aos objetos técnicos teria por consequência fazer, dos pontos-chave das redes técnicas, termos de referência reais para o conjunto de grupos humanos (Simondon 2008:220)

NORMATIVIDADE DA REDE TÉCNICA (em contraposição às ferramentas individuais)

[T]roca-se de ferramenta e de instrumento, pode-se construir ou consertar uma ferramenta, mas não se troca de rede, não se pode construir sozinho uma rede: só podemos nos ligar à rede, nos adaptarmos a ela, participar dela; a rede domina e encerra a ação do ser individual, domina mesmo cada conjunto técnico. Tal forma de participação ao mundo natural e ao mundo humano dá uma normatividade coletiva irredutível à atividade técnica. […] [A]través das redes técnicas, o mundo humano adquire um alto grau de ressonância interna. As potências, as forças, os potenciais que impulsionam à ação, existem no mundo técnico reticular da mesma forma como poderiam existir no universo mágico primitivo; a tecnicidade faz parte do mundo, ela não é somente um conjunto de meios, mas um conjunto de condicionamentos da ação e de incitações à ação; a ferramenta ou o instrumento não têm poder normativo por estarem permanentemente à disposição do indivíduo; o poder normativo das redes técnicas aumenta junto com a ressonância interna da atividade humana nas realidades técnicas. (Simondon 2008:221)

RETICULAÇÃO TECNOPOLÍTICA

[T]oda doutrina política e social tende a se apresentar como um absoluto, válido de maneira incondicional, fora de todo hic et nunc [aqui e agora]; no entanto, o pensamento social e político aceita colocar problemas concretos e atuais; como o pensamento técnico em desenvolvimento, ela leva a uma representação reticular do mundo, com pontos-chave e momentos essenciais; ele se aplica à realidade técnica tratando-a como mais que um simples meio, e a apreende bem ao nível da reticulação, da inserção no mundo natural e humano. […] Os pensamentos social e político se inserem no mundo segundo um certo número de pontos notáveis, de pontos problemáticos que coincidem com os pontos de inserção da tecnicidade encarados como rede. (Simondon 2008:223-4)

FILO MAQUÍNICO e COSMOPOLÍTICA

Uma mudança técnica leva a uma modificação disso que se poderia chamar de constelação política do universo: os pontos-chave se deslocam na superfície do mundo (Simondon 2008:223)

RETICULAÇÃO TECNOPOLÍTICA e TECNOCRACIA

[A] repartição e inserção de pontos-chave do pensamento político e social no mundo coincide, pelo menos parcialmente, com aquela dos pontos-chave técnicos, e […] essa coincidência se torna mais perfeita à medida que as técnicas se inserem mais e mais no universo sob a forma de conjuntos fixos, ligados uns aos outros, encerrando os indivíduos humanos nas malhas que eles determinam. (Simondon 2008:224)

TÉCNICA E TECNOLOGIA

[O] pensamento técnico deve desenvolver a rede de pontos relacionais do homem e do mundo tornando-se uma tecnologia, isto é, uma técnica de segundo grau de se ocupa de organizar esses pontos relacionais. (Simondon 2008:226)

CONHECER REDES TÉCNICAS É UMA EXPERIÊNCIA CULTURAL FUNDAMENTAL

É a inserção concreta numa rede técnica particular que deve ser experimentada, na medida em que ela coloca ohomem em presença e no interior de uma série de ações e de processos que ele não dirige sozinho, mas dos quais participa. (Simondon 2008:228)

TECNOLOGIA e ECUMENISMO

A apreensão consciente da função de pluralidade e da função de unidade são necessárias como bases, a fim de que a mediação, no nível desse reencontro entre o estatuto de pluralidade e o estatuto de superioridade com relação à unidade, que realiza a estrutura de reticulação, seja possível no ponto neutro do devir do pensamento. (Simondon 2008:233)

RETICULAÇÃO INTUITIVA

A intuição é, com efeito, relação ao mesmo tempo teórica e prática com o real; ela o conhece e age sobre ele, pois ela o apreende no momento em que ele devém; o pensamento filosófico é também gesto filosófico vindo se inserir na estrutura reticular figura-fundo que se determina no ser; a filosofia intervém como poder de estruturação, como capacidade de inventar estruturas que resolvem problemas do devir, no nível dessa natureza intermediária entre a pluralidade e a totalidade, que é a diversidade reticular dos domínios de existência. (Simondon 2008:237-8)

AS 3 INTUIÇÕES/RETICULAÇÕES, A CULTURA e A RETICULAÇÃO NORMATIVA (“dever”; obrigação de devir?)

Pode-se dizer que existem três tipos de intuição, segundo o devir do pensamento: a intuição mágica, a intuição estética e a intuição filosófica. A intuição estética é contemporânea do desdobramento do pensamento mágico em técnicas e religião, e ela não efetua uma síntese verdadeira das duas fases opostas do pensamento: ela indica somente a necessidade de uma relação, e a realiza alusivamente num domínio limitado. O pensamento filosófico, ao contrário, deve realizar realmente a síntese, e ele deve construir a cultura, coextensiva à realização de todo pensamento técnico e de todo pensamento religioso; o pensamento estético é, assim, o modelo da cultura, mas ele não é toda a cultura; ele é muito mais o anúncio da cultura, uma exigência de cultura, do que a cultura em si; pois a cultura deve reunir realmente todo pensamento técnico a todo pensamento religioso, e por isso deve ser feita pelas intuições filosóficas, originando-se dos acoplamentos operados entre conceitos e ideias. (Simondon 2008:238-9)

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